02 de maio de 2024

Juiz manda que Padre de Carlinda não culpe menores vítimas de abuso sexual e impõe sanções

O juiz Jean Garcia de Freitas Bezerra, da 2ª Vara de Alta Floresta, concedeu parcialmente a tutela de urgência solicitada pela Defensoria Pública do Estado e determinou que o padre de Carlinda Ramiro José Perotto se abstenha fazer referências a respeito de crianças e adolescentes que, de alguma forma, fomente discriminação, abuso ou as coloquem como culpadas ou contribuintes para crimes contra a liberdade sexual.

O descumprimento resultará em multa de R$ 10 mil por declaração contrária à decisão judicial.

O magistrado ainda determina que páraco seja intimado para cumprir a decisão. A Defensoria Pública também deve tomar ciência.

O motivo da ação da Defensoria Pública são as declarações do padre, que atua na Paróquia São José Apóstolo, em Carlinda, sobre o caso da menina de 10 anos de Espírito Santo, estuprada pelo tio e que engravidou, tendo que passar por aborto autorizado pela Justiça. Na internet, ele disse que a garota compactuou com o estupro.

No âmbito policial, o caso foi tratado como apologia ao estupro. Já os defensores Letícia Parobé Gibbon e Moacir Gonçalves Neto que assinam a ação veem no comentário do padre “notória má-fé e com o propósito de ridicularizar de forma genérica e ampla crianças/adolescentes e mulheres”.

Na ação inicial, eles destacam que os comentários do padre no Facebook e uma entrevista que ele deu para Balança Geral, transmitido pela TV Nativa de Alta Floresta, filiada a Rede Record. Nela, o pároco volta a reafirmar que crianças provocam homens com shorts curtos.

“Crianças e adolescentes menores de 14 anos não possuem o discernimento necessário para consentir com a prática de qualquer ato sexual” Defensora Leticia Gibbon

Os defensores pontuam que as declarações reforçam a cultura do estupro, que houve violação ao direito dos menores de idade e que as declarações ultrapassam a liberdade de expressão, pois viola à dignidade sexual de crianças, adolescentes e mulheres.

“Crianças e adolescentes menores de 14 anos não possuem o discernimento necessário para consentir com a prática de qualquer ato sexual. Alegar que crianças provocam sexualmente homens, seja por seu comportamento, seja por suas vestimentas, ou que engravidam por opção, é responsabilizar a vítima pela ocorrência de um crime, contribuindo para o processo de revitimização e de naturalização do abuso sexual infantil”, declara a defensora Leticia Gibbon.

Retratação e multa

Além da indenização de R$ 100 mil, os defensores pediram que a Justiça proíba o padre de fazer comentários sobre comportamento de crianças e adolescentes vinculado a prática de atos sexuais, em meios de comunicação, sob pena de R$ 10 mil para declaração.

Pedem também a retratação do padre Ramiro José sobre os comentários e da publicação de uma nota de repúdio por parte da Diocese.

Os defensores direcionam o dinheiro da indenização, em caso de condenação, ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos, controlado pelo Poder Judiciário. Vai caber ao juiz do caso destinar uma causa ou instituição para receber a quantia.  O valor de R$ 100 mil deve ser atualizado com juros quando sair à decisão judicial.

Decisão

No entanto, o magistrado deferiu parcialmente o pedido da Defensoria Pública. Isso porque, reconheceu o direito do padre Ramiro José Perotto de ministrar a religião e professar ensinamento bíblico, inclusive para crianças e adolescentes. Ressalta porém, que o sacerdote não pode promover a “cultura do estupro”.

“Contudo, com relação ao pedido provisório, a fim de resguardar a autonomia do requerido de professar ensinamentos bíblicos relacionados ao sexo, a abstenção deve recair apenas quanto a dizeres que possam colocar crianças e adolescente em situação vexatória ou discriminatória relacionadas à sexualidade, como o fez os colocando como “provocadoras”, assim como que possam atribuir a crianças e adolescentes a concorrência ou exclusividade de culpa por crimes sexuais contra eles cometidos. Apesar do sentido aberto, que exige o controle judicial e interpretação dos fatos, cabe ao requerido deixar de proferir pronunciamentos públicos que de alguma forma promovam a cultura do estupro, segundo os termos da fundamentação”, diz trecho da decisão.

O dano moral coletivo, que requer indenização de R$ 100 mil, não foi julgado. Neste caso, a Diocese de Sinop, à qual a Paróquia São José Apóstolo é subordinada, também é alvo do processo de indenização.

Fonte: www.nativanews.com.br (01-09-20).

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